HERÓIS FIÉIS

(Um estudo de Hebreus 11:1-7)

Hebreus 11 é chamado frequentemente o capítulo da fé. Diz-nos como várias pessoas responderam com fé ao que Deus lhes disse. Porém estas histórias não são contadas como uma vulgaridade histórica – elas também nos animam a ter fé nos problemas de cada dia.

A epístola aos Hebreus acabava de dizer aos leitores que Deus quer que o Seu povo “viva pela fé” (10:38). Ele quer que eles perseverem fazendo a Sua vontade e recebam o prometido (v.36). Os cristãos são pessoas “que têm fé e perseveram na vida” (v.39).

O capítulo 11 descreve então como é a fé: “A fé é a certeza de já se possuírem as coisas que se esperam e a garantia das coisas que se não vêem” (v.11:1). Os oradores antigos às vezes davam uma breve definição de uma palavra da qual queriam falar. Não era uma definição completa, porém davam a entender uma característica da fé. Os comentadores argumentam bastante acerca do significado preciso das palavras gregas usadas aqui: É a fé um sentimento de possuirmos uma garantia ou é a substância da nossa esperança ? Estes debates com frequência não acertam num ponto importante, porque o autor não está a tratar de definir a fé, mas sim a descrever um dos resultados que ela tem nas nossas vidas. Esse ponto significa que a fé é acreditar e actuar sobre algo que não podemos ver. Esta é a qualidade da fé que o autor quer que os leitores imitem.

“Foi pela fé que os antigos receberam a aprovação de Deus” (v.2). O elemento da fé é um fio que corre ao largo da história do povo de Deus e o autor também o traz até ao tempo presente ao acrescentar: “Pela fé compreendemos que o universo foi criado pela Palavra de Deus, de modo que aquilo que se vê veio do que se não vê” (v.3), referindo-se a Génesis 1:3 e Salmo 33:6).

Desde o princípio até ao momento presente, é necessária a fé. A própria criação mostra-nos que só pelo facto de algo não poder ser visto, não significa que não possa ocorrer. O autor não nos diz que Deus fez tudo vindo do nada – ele só diz que Deus fez o visível procedente do invisível; esse é o contraste que ele quer fazer. O nosso futuro não se baseia no que vemos hoje, pelo contrário, baseia-se em alguém que não vemos: Deus. E com essa breve introdução, o autor começa a dar exemplos:

“Pela fé, Abel ofereceu a Deus um sacrifício melhor do que o de Caim. Por causa da sua fé, Deus considerou-o seu amigo e aceitou com agrado as suas ofertas. E é pela fé que Abel embora tenha morrido, ainda fala “ (Heb.11:4).

Génesis 4, de facto diz-nos muito pouco acerca de Abel: “Abel ofereceu as primeiras e melhores crias do seu gado, e Deus ficou contente com Abel e com a sua oferta” (Gén.4:4), e nada disse acerca da fé. Não obstante, o autor de Hebreus assume que se Deus estava agradado, então Abel deve ter tido fé.

O seguinte exemplo vem de Henoc: “Pela fé, Henoc foi levado para a outra vida, sem passar pela morte; Deus levou-o e ninguém mais o viu cá na terra. É que antes de sair deste mundo, diz a Escritura Sagrada que ele “agradou a Deus” (Heb.11:5, citando Gén.5:24).

Mais uma vez, Génesis diz pouco acerca de Henoc, porém as lendas judaicas diziam que ele foi levado para o céu e isto reflecte-se nos comentários do autor – que Henoc não morreu. Deus levou-o porque “caminhou com Deus”, o que o nosso autor toma como evidência de que ele tinha fé. Não sabemos exactamente no que ele tinha fé. Não sabemos exactamente no que ele acreditou ou no que ele fez. Os leitores provavelmente não necessitam de nenhuma prova de que Henoc tinha fé, porque já sabiam que Henoc era um bom jovem. O autor não está a tratar aqui de defender o seu caso com lógica – está a pintar um quadro, apresentando a fé, não como uma coisa estranha, mas sim como algo normal para o povo de Deus.

Os leitores já sabem que a fé é boa, porém o autor está a usar a sua habilidade como orador para construir emoções positivas para a fé, quando os leitores possivelmente já encaravam consequências desagradáveis por terem fé em Jesus Cristo. Para Abel, a fé significou uma morte precoce; para Henoc significou o oposto. De qualquer maneira, o povo de Deus necessita de fé.

Depois destes dois exemplos introdutórios, o autor estabelece a lição que quer realçar: “Sem fé, ninguém pode agradar a Deus, porque quem se aproxima de Deus deve acreditar que ele existe e que é ele quem recompensa os que o procuram “ (Heb.11:6).

Nesta pequena profissão de fé, o autor recorda-nos que Deus recompensa os fiéis – aqueles que o buscam. Ainda que não possamos vê-lo temos provas de que Ele existe. Além das recompensas sobrenaturais, a fé tem recompensas naturais aqui e agora: A fé sente-se melhor do que o medo.

O autor enfatiza mais o seu ponto de vista ao começar cada oração com “por fé”: por fé Noé acreditou no aviso de Deus a respeito das coisas que ainda se não viam e construiu uma embarcação em que ele e a sua família se salvaram. Deste modo, condenou o mundo e Deus considerou-o seu amigo por causa da fé” (v.7). Sobre Noé, o autor tem mais informação bíblica: Deus advertiu Noé sobre o dilúvio, dizendo-lhe que construísse uma embarcação, e Noé obedeceu e salvou-se a ele e a sua família (Génesis 6-9).

Na realidade Noé não condenou o mundo (Deus fez isso, com base no comportamento deles), porém o fiel exemplo dele tornou óbvio quão mal e sem esperança tinha chegado o mundo – ninguém se arrependeu apesar de terem sido advertidos com 120 anos de antecedência. E devido à sua fé Noé veio a ser nomeado um herdeiro da justiça. É a primeira pessoa na Bíblia que é chamada justa (Génesis 7:1). Como mais tarde se diria de Abraão, “acreditou e foi reconhecido como justo” (Gén.15:6). Ele foi considerado justo perante Deus porque foi fiel.

A palavra grega “pistis” pode significar tanto fé como fidelidade, e muitas pessoas têm notado que Hebreus amiúde a usa no sentido de fidelidade ou obediência.

Ainda que Paulo ocasionalmente usa a mesma palavra no sentido de fidelidade, geralmente refere-se a ter fé. A obediência é a prova da fé, e ambas são necessárias. Noé fez o que Deus lhe disse que fizesse, porque ele confiou em Deus. Ele acreditou que Deus condenaria os malvados e salvaria Noé e a sua família se eles construíssem a arca.

Original: Michael Morrison, 2006-8, “Héroes fieles”

Tradução: Manuel Morais, 2007-02